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Tudo tem uma explicação. Saídos de uma ditadura, iniciados numa revolução, os portugueses eram seres de grande fragilidade democrática quando foram chamados às urnas em 1975. A maioria votava pela primeira vez, todos votavam pela primeira vez em liberdade. A propaganda política era uma novidade, a campanha eleitoral uma coisa completamente nova, os comícios uma atracção grande, com os políticos ali tão perto.
Tudo era política, num tempo em que as cantigas eram sobretudo uma arma e as campanhas de alfabetização ensinavam bem mais do que o a-é-i-ó-u. O dia de reflexão surgiu, assim, como uma protecção que o legislador sentiu ser necessária.
Algumas coisas, igualmente proteccionistas, mudaram entretanto: a divulgação de sondagens, por exemplo, só podia ser feita até uma semana antes das eleições e, hoje, já podem ser publicadas até ao último dia de campanha.
A reflexão, porém, manteve-se, tal como a necessidade de não haver propaganda junto das mesas de voto.
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Os próprios órgãos de comunicação social, devendo tratar todos os partidos por igual, estavam no início da democracia sujeitos a uma ditadura de linhas (nos jornais) ou segundos (na RTP, única estação existente) que visava que todos - partidos ou candidatos - fossem tratados por igual, coisa impossível, porque nem todos tinham as mesmas possibilidades e notoriedade, além de que, como depressa se reconheceu, o interesse jornalístico justificava também que o critério não fosse estreito, não olhasse apenas à equidade que, ingenuamente, a lei queria garantir.
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As coisas evoluíram, mas a imposição da reflexão mantém-se. Não fará grande sentido, mas uma mudança da lei não trará outra coisa que não seja prolongar os mesmos discursos, alargar as mesmas mensagens, mostrar os mesmos protagonistas por mais um dia. Um dia de reflexão como o que ontem passámos pode, afinal, ser útil para os actores principais - eles, sim - reflectirem no que nos disseram e nos prometeram. Oxalá o tenham aproveitado!
José Leite Pereira
in JN
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