Em poucos dias, já são dois os bispos a sair da sacristia,
onde era suposto deverem estar confinados a tratar em dedicação exclusiva de
assuntos divinos, para apontar o dedo acusador a César, responsabilizando-o pela
tragédia social que se abateu sobre o país, cuja verdadeira dimensão a Igreja,
através da sua obra assistencial, conhece provavelmente melhor do que ninguém.
E se D. Januário Torgal Ferreira falou, referindo-se a alguns membros do
actual Governo, de "tipos que lutam pelos seus interesses, têm o seu gangue, têm
o seu clube e pressionam a comunicação social", o arcebispo de Braga, D. Jorge
Ortiga, fala de políticos para quem "muitas vezes e quase sempre, vale apenas o
[seu] bem-estar pessoal ou, quando muito, do seu grupo ou partido". Tudo indica que o primeiro-ministro se terá precipitado quando agradeceu ao bom povo português a "paciência" com que vem suportando as medidas de austeridade impostas ao país pelo seu Governo, a pretexto de uma crise de que são responsáveis e principais beneficiários os "interesses", "gangues", "grupos" e "partidos" de que falam os bispos.
Talvez tenha sido justamente esse agradecimento que, por soar excessivamente a hipocrisia, terá feito saltar finalmente a tampa, já não digo do bom (e, a crer no primeiro-ministro, "piegas") povo português, mas do povo de Deus ou, pelo menos, dos seus representantes.
(JN)
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