Confessem, prezados leitores: têm a certeza absoluta de que não cheiraram ninguém hoje? Ninguém mesmo, nem meia-pessoa sequer? Não cheiraram ninguém nas últimas semanas, ou nos últimos meses?
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Podem garantir então com infalibilidade governativa que não passaram as vossas sensíveis fossas nasais por nenhum sistema fecal suspeito? E já agora, quantos porcos conhecem? Quando foi a última vez que estiveram olhos nos olhos com um? Desculpem perguntar, mas por onde têm andado? Viagens a Cancún, empregadas mexicanas, primos em Tegucigalpa? Precisamos saber tudo.
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Porque, vocês compreendam: nós queremos segurança, pelamo-nos por segurança. Os aeroportos já nos protegem de terroristas árabes. A ASAE defende-nos de restaurantes assassinos. Schengen é a nossa muralha contra imigrantes. Doenças, só as do sexo. Nem uma simples febre. Estava pois tudo tão arrumadinho, tão calculado até se ouvir soar o alarme. E o alarme tinha nome: os porcos. Esqueceram-se dos porcos. Pensaram nas vacas e nas aves, mas não nos porcos. Quem é que se iria lembrar agora que o perigo são os porcos? Só nos faltava mais esta.
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Talvez toda a razão esteja do lado de José Saramago. Ontem, no DN, o nosso escriba nobelizado avançou com uma explicação persuasiva para o surgimento da gripe suína. A culpa, diz Saramago, é do capitalismo pecuário. Durante anos, os porcos habitaram em condomínios de granjas espaçosas e bem-tratadas. Hoje são 65 milhões de porcos obrigados a partilhar pão e leito num número exíguo de pocilgas. Resultado: o mundo já fede. Ou, por outras palavras, fizemos merda.
Eu não sei nada.
O que sei é que a confortável ilusão de segurança e invulnerabilidade com que nos habituámos a viver não passa disso mesmo: uma ilusão.
Pedro Lomba
in DN
viernes, 1 de mayo de 2009
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